quinta-feira, 10 de abril de 2008

Mil e Uma Noites do Jazz na Culturgest


Rabih Abou-Khalil e Joachim Kühn Trio
19 de Janeiro de 2008 – 21.30h
Grande Auditório da Culturgest – Lisboa
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Mais uma noite de luxo na Culturgest, com um trio tão imprevisto quanto conseguido. Libanês radicado, desde os anos 70, na Alemanha (em consequência da guerra civil no seu país) Rabih Abou-Khalil é um dos músicos do médio oriente mais bem sucedidos na Europa, fruto não só de um domínio avassalador do seu instrumento (o Oud, equivalente árabe ao alaúde nacional, de onde provém aliás a designação - al-oud originou alaúde em português) mas também de uma predisposição de longa data para os projectos de fusão onde coexistem as influências orientais da sua cultura natal (ainda para mais expressas num instrumento cuja sonoridade remete de imediato para as paragens exóticas de além Mediterrâneo) com a formação clássica e a longa vivência na Europa do músico. Para Khalil a música é, “numa sociedade fortemente globalizada como a que vivemos, necessariamente de fusão, sob pena de cair em fundamentalismos que, por mais bem intencionados que sejam, não deixam por isso de ser radicais”. O virtuosismo, enorme capacidade de improvisação e de fusão do libanês (aos quais adicionou nesta noite da Culturgest a revelação de falar em português com o público durante todo o concerto e um extraordinário sentido de humor…) não podiam ter encontrado melhor parceiro para este ousado projecto de fazer jazz com um oud, do que o alemão Joachim Kühn. Menino prodígio do piano (revelou-se aos 5 anos de idade, a tocar Schumann pela pauta!) da ex-RDA, Kuhn tem-se mostrado um mestre dos sete ofícios, oscilando entre a música clássica, o jazz, o rock ou a música contemporânea, tal como entre o piano e o saxofone (se outros talentos não remanescerem escondidos) com uma facilidade assombrosa. A sua capacidade técnica e de improvisação no piano é verdadeiramente espantosa e a facilidade com que se adaptou ao universo musical exótico de Khalil acaba por não surpreender de tal forma é variado e brilhante o seu currículo musical. O resultado é efectivamente uma obra de fusão (outra coisa não poderia ser) mas brilhante na ousadia da combinação dos ambientes musicais ocidental e oriental sob a bandeira única do talento e do amor pelo jazz e pela improvisação sobejamente demonstrada pelos extraordinários músicos envolvidos. A maior surpresa da noite acabou assim por ser o jovem percussionista norte-americano Jarrod Cagwin que, apesar da juventude (licenciou-se apenas em 1996 no Berkeley College of Music), mostrou um surpreendente à-vontade neste complexo universo musical de Khalil e Kühn, mesmo quando foi preciso pegar em instrumentos tradicionais árabes e levar-nos até às mil e uma noites do jazz norte-africano ou do médio oriente. Um extraordinário percussionista que conseguiu disputar, no bom sentido, o protagonismo da noite aos dois experimentados chefes de fila. Um concerto memorável de três grandes músicos inconformistas e capazes de alargar as fronteiras da boa música (seja ela o jazz, a música contemporânea ou outra) até territórios nunca dantes navegados. Uma grande chapelada para estes três magníficos!

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