quinta-feira, 10 de abril de 2008

Dedadas


Sexteto Mário Barreiros
Dedadas
Clave de Som
Fevereiro 2007
15,5/20

Músico poliglota, mais conhecido pelo seu envolvimento em projectos Pop, como os Bandemónio de Pedro Abrunhosa ou os Já Fumega, Mário Barreiros dedicou os mais recentes anos da sua carreira à tarefa de produtor musical, com assinalável sucesso. Lançou-se agora num projecto mais pessoal, juntamente com músicos da Escola de Jazz do Porto, construindo este disco de jazz, denominado Dedadas, gravado no primeiro dia de 2007 e lançado em Fevereiro do mesmo ano, com apresentação na Casa da Música do Porto.
Ao lado da bateria, entregue ao líder do grupo e que também assina três dos sete temas do álbum, estão o piano de Pedro Guedes, autor de duas composições, o contrabaixo de Pedro Barreiros e os saxofones de Mário Santos (autor de dois originais e que igualmente toca clarinete baixo), de José Luís Rego (saxofone alto e clarinete) e de José Pedro Coelho.
É um trabalho muito conseguido, na sua homogeneidade acústica, construída porém a partir da diversidade criativa dos músicos que integram este sexteto.
Os temas, embora exibindo uma estrutura clássica, são apelativos, plenos de fantasia e criatividade, conseguindo, apesar disso, nunca roubar espaço à melodia. Desenvolvem-se geralmente a partir do trio de base (piano, contrabaixo e bateria) ao qual se juntam os metais (e ocasionalmente o clarinete). Primeiro em uníssono, apresentando o tema, depois em solos alternados nos quais se desenvolve a criatividade inventiva dos intérpretes, para terminarem de regresso à configuração de sexteto.
Contudo são duas as excepções a esta regra do jazz clássico: o pequeno mas lindíssimo Libertação Interior, de Mário Santos, totalmente construído a partir de belas polifonias criadas pelos sopros, e a valsa ¾ (Três Quartos) de Mário Barreiros, claramente composta e desenvolvida ao piano.
As outras duas composições de Mário Barreiros são criadas a partir da bateria, com ritmos complexos e contagiantes, num trabalho notável do baterista. Em Juvenal Barreiros faz eco dos delta blues de influência Bayou da Louisiana francófona. Já em Dedadas o registo é mais free bop, marcado por um solo inicial de bateria com mais de dois minutos.
Mas o tom geral do disco, à excepção do original Juvenal e dos mais expressionistas Dedadas e Semelhança (este da autoria de Mário Santos), é muito mais cool que bop.
Com melodias bem desenhadas ritmicamente e desenvolvidas de modo intimista e belo, expressivo mas nunca meloso ou enjoativo, geralmente nos saxofones, Dedadas é assim um disco de alma bem latina, herdeiro de uma certa forma nostálgica de viver o jazz, característica de italianos e portugueses, e muito menos de americanos ou escandinavos.
A coroar esta nostalgia latina está a bela balada de Pedro Guedes FJP #2, para mim a mais bela do disco.
Um trabalho carregado de mérito e de talento, sintomaticamente só composto por originais dos músicos envolvidos, e superiormente produzido, mostrando que há muita e boa gente a fazer jazz de grande qualidade de norte a sul do país.

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