quinta-feira, 10 de abril de 2008

Lontano


Lontano – Tomasz Stanko Quartet
20 de Fevereiro de 2008 – 21.30h
Grande Auditório da Culturgest – Lisboa
****,5

Esta bem podia ter sido a semana do trompete. Depois de Enrico Rava no CCB tivemos Tomasz Stanko na Culturgest, dois dos mais importantes e emblemáticos trompetistas europeus da actualidade. Os estilos são totalmente diferentes: Rava mais influenciado pelo trabalho dos ícones do jazz norte-americanos (com quem trabalhou assiduamente) Stanko com uma linguagem cool muito própria, feita do legado de Miles Davis (é sempre a referencia incontornável no trompete) e das influências musicais clássicas da sua Polónia natal e do universo jazzistico norte-europeu. Aliás se tais referências são notórias em Stanko mais ainda se evidenciam no trio que o acompanhou (o Simple Acoustic Trio, com um trabalho brilhante já gravado também pela ECM de Manfred Eicher) composto pelos jovens e talentosos Marcin Wasilewski no piano, Slawomir Kurkiewicz no contrabaixo e Michal Miskiewicz na bateria. Um luxo.
Wasilewski encantou no piano, com um fraseado original, contido mas profundamente expressivo, tecnicamente superior e influenciado pela música contemporânea europeia, do leste e do norte da Europa. Kurkiewicz no contrabaixo mostrou talento e desenvoltura, com uma soberba capacidade de improvisação e fantasia, garantindo a coesão assinalável do quarteto e a originalidade do respectivo som, exibindo técnica notável. Mais contido Miskiewicz na bateria. Nitidamente influenciado pela escola escandinava (veio-me à lembrança Magnus Östrom) pontificou a sua actuação por uma invejável contenção em prol do som colectivo, intimista, melódico em que o ritmo mais do que apropriar-se do som do grupo, serve altruisticamente a harmonia, em perfeita simbiose com os restantes instrumentos, não descurando o uso dos silêncios, quando tal se impõe.
Este Tomasz Stanko Quartet exprime assim, de forma notável e original, um jazz marcadamente europeu, despido de influências afro-americanas mas fortemente enriquecido com a tradição musical clássica e contemporânea do velho continente. Mas não se pense que soa frio e intelectual, como tantas experiências cacofónicas que proliferam por aí… Longe disso, a música de Stanko e dos seus pares é quente e melodiosa, quase romântica na forma apaixonada como comunica com o público, rapidamente deliciado e envolvido pelas doces harmonias produzidas pelo quarteto, para quem a improvisação surge como a forma natural de fazer música.
Uma noite memorável com alguns dos melhores intérpretes do jazz europeu e mundial da actualidade, mostrando a vitalidade da escola de jazz polaca (com várias gerações representadas em palco) e projectando-a internacionalmente. De modo inteiramente merecido.

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