quinta-feira, 8 de maio de 2008

O Bardo da Diáspora Africana


Omar Sosa
Afreecanos
Ota records 2008
16,5/20

Ao ler há dias uma entrevista de José Peixoto (o reputado ex-guitarrista dos Madredeus actualmente envolvido nos projectos Sal e El Fad) à revista Jazz.pt retive algumas linhas que me pareceram particularmente interessantes e que se aplicam perfeitamente a este trabalho de Omar Sosa: “Há um tipo de fusão, serôdia, que gera uma diluição ao nível da identidade, não sobrando mais do que umas bases rítmico-harmónicas com uns solos por cima (…), que por muito virtuosismo que haja envolvido, não se dá pela alma. (…) Por outro lado, há um outro tipo de fusão, a que gera novas entidades e identidades que se alimenta em várias latitudes e folclores vários e procura soluções originais e com conteúdo. (…) é uma música que se revigora todos os dias(...)".
Palavras sábias e que descrevem na perfeição o trabalho deste extraordinário músico cubano. Omar Sosa nasceu em 1965 em Camagüey, Cuba, filho de um professor de história e filosofia na escola daquela cidade. Com oito anos começou a estudar percussão no conservatório local. Concluído esse primeiro nível da sua educação musical transitou para a Escuela Nacional de Musica em Havana, ainda dedicado à marimba. Foi em Havana que descobriu o piano e concluiu os respectivos estudos em 1983 no Instituto Superior de Arte em Havana. Depois de várias colaborações com artistas cubanos, como pianista e arranjador, mudou-se em 1993 para Quito, no Equador, onde descobriu o folclore das Esmeraldas, uma região na costa noroeste daquele país, em que subsiste uma cultura musical forte de raiz africana, baseada na marimba (que Sosa nunca deixou de tocar e estudar). Depois de uma breve passagem por Palma de Maiorca, mudou-se para a Califórnia impondo-se rapidamente na comunidade jazzistica de San Francisco. Poucos meses depois gravaria o seu primeiro disco para a Otá Records (este é já o seu décimo sétimo trabalho para aquela editora, dois deles nomeados para os Grammys). Em 2003 foi homenageado pela Smithsonian Institution de Washington com um prémio de carreira pelo seu contributo para o desenvolvimento da música latina norte-americana.
Muito se fala hoje de World Jazz, a tal fusão criativa e enriquecedora a que se referia José Peixoto, mas poucos músicos a personificam como Omar Sosa. A título de curiosidade não posso deixar de referir que neste disco participam músicos cubanos, moçambicanos, senegaleses, franceses, malianos e brasileiros. Entre os instrumentos tradicionais por eles tocados figuram a kora, ngoni, citara, batá, timbales, kongoman, m’bira e talking drum. E Sosa encontra sempre lugar para os seus magníficos solos e arranjos de piano, por entre esta riquíssima panóplia de sonoridades tradicionais (e não tão tradicionais, como os metais, o contrabaixo ou as mais habituais percussões caribenhas), bem como para o inspirado trompete do francês Stephane Belmondo, com trabalho de destaque neste disco gravado na Alemanha. Como alguém referiu com pertinência: Omar Sosa combina o folclórico com o contemporâneo e o ancestral com o urbano. Diria mesmo que Sosa se converteu no bardo da diáspora africana, nunca deixando porém que a ortodoxia se intrometa na sua busca da liberdade criativa. Um músico referencial no jazz moderno.

Veja o videoclip Light in the Sky, extraído do disco Afreecanos de Omar Sosa.

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