sexta-feira, 9 de maio de 2008
Dueto Imprevisto
Ketil Bjørnstad e Terje Rypdal
Life in Leipzig
ECM 2008
15,5/20
Um disco gravado ao vivo no Leipzig’s Opera House, durante o festival de jazz da cidade em 2005, por uma estação de rádio alemã, a MDR, e que é agora lançado pela ECM.
Estamos perante uma obra notável, até pela ousadia criativa que representa um projecto musical em duo de piano e guitarra eléctrica. Ainda para mais entregues a dois personagens magistrais como são Terje Rypdal e Ketil Bjørnstad.
O primeiro é um guitarrista de excepção, com 22 discos gravados como líder desde 1970 e pela ECM, sem contar com inúmeras colaborações com outros artistas como Barre Phillips, Tomasz Stanko, Edward Vesala, Michael Mantler, Heinz Reber e Ketil Bjørnstad, entre outros. O seu som é extremamente característico (é daqueles músicos cujo som se identifica ao primeiro acorde…) e bebe de influências tão diversas como o romantismo de Grieg ou a ousadia dos trabalhos electrónicos de Ligeti ou Stockhausen. A sua obra abrange do hard-rock à música sinfónica e coral, passando naturalmente pelo jazz.
A sua ligação a Ketil Bjørnstad já tem dez anos de idade (um duo improvável mas de sucesso longevo) e tem ganho raízes na estrada, de Taiwan ao Canadá, de Lanzarote às ilhas Shetland, passando naturalmente (e muito) pela sua Noruega natal.
Bjørnstad é um fenómeno cultural da Noruega. Além de pianista, compositor-arranjador, improvisador e intérprete que lançou já 50 discos (!!) desde 1972, compôs bandas sonoras para filmes de Jean-Luc Godard, Lea Pool, Ken Loach ou Witold Adamek, publicou mais de 30 livros na Noruega, que vão da ficção à poesia passando pelo ensaio (já traduzidos em várias línguas), e arranja ainda tempo para, desde há 25 anos, escrever crítica de música e literatura no jornal norueguês Aftenposten.
Musicalmente Ketil Bjørnstad oscila entre o pop e o clássico com várias incursões pelo universo jazz, muito mais caracterizadas por uma estética ambiental, estruturalmente rica, do que pelo virtuosismo dos solos.
Estas premissas certamente aguçam o apetite dos curiosos quanto ao modo como se cruzam estes universos musicais tão distintos, em duo. Por estranho que pareça cruzam-se muito bem… Por um lado temos um Bjørnstad mais expressivo, como que “puxado” pela irreverência da guitarra de Rypdal. Por outro temos um Terje Rypdal como que “amansado” pelas influências clássicas do piano de Bjørnstad. O resultado é um trabalho limpo, melódico, ambiental quase nocturnal (como sugere a inclusão de um breve trecho do notturno de Grieg no espectáculo). A guitarra de Rypdal soa como se fosse arqueada (quase como um violoncelo) raramente causando estranheza pela sua integração no universo acústico do piano. Ora dedicando-se a tarefas harmónicas ou texturais de forma contida, ora apropriando-se dos solos com um raro sentido melódico que se integra perfeitamente nos arpeggios e glissandos do piano de Bjørnstad. Só em Le Manfred / Foran Peisen, aparece o Rypdal experimental e apaixonado pelo fantástico que conhecemos de trabalhos anteriores, para logo de seguida, em The Return Of Per Ulv, culminar este trabalho numa toada pop-rock, mais ritmada e apelativa, em jeito de apoteose final.
Em suma um trabalho muito original e conseguido de um duo que conseguiu transformar um casamento imprevisto de sonoridades numa mais valia harmónica, atraente e apelativa. Daquelas ligações ousadas que a ECM sabe tão bem fazer…
Oiça Ketil Bjørnstad no tema Prelude 13.
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