sábado, 20 de setembro de 2008

Searching For Adam


Rodrigo Amado
19 de Setembro de 2008, 21.30h
Grande Auditório da Culturgest (Lisboa)
***,5

À procura de Adam personifica a busca de Rodrigo Amado de uma linguagem artística própria, enquanto músico e fotógrafo. Através de um espectáculo transdisciplinar este saxofonista português, nascido em 1964 e formado na escola do Hot Club de Portugal, apresenta-nos o resultado dessa busca, efectuada com recurso à música improvisada mas também pela projecção simultânea de uma sequência de fotos, captadas pela lente de Rodrigo Amado e organizada também de forma improvisada pelo fotógrafo Guillaume Pazat, das ruas e gentes de Nova Iorque. Esta cidade, onde Amado residiu, funciona como uma metáfora do mundo inteiro, atentas as suas características de metrópole que une uma enorme variedade de raças, estilos e formas de vida, em aparente completa liberdade.
Rodrigo Amado é o líder dos Lisbon Improvisation Players, formação ímpar na busca de uma estética experimental e totalmente improvisada no jazz nacional. Paralelamente envolveu-se em inúmeros projectos na área do pop (Mão Morta, Plopoplot Pot, RAUM), colaborou com músicos como Jorge Palma, Xutos e Pontapés, Pop del Arte ou Rádio Macau e, na área do jazz, tocou com Dennis Gonzalez, Peter Epstein, Carlos Zíngaro, Steve Swell. Ken Filliano ou Steve Adams, entre muitos outros.
Amado é ainda coordenador para a área de jazz do jornal Público e fundador, juntamente com Pedro e Carlos Costa, da editora de jazz Clean Feed.
Nesta sua viagem interdisciplinar pelas ruas de Nova Iorque trouxe a acompanhá-lo três músicos norte-americanos: o trompetista Taylor Ho Bynum, o baterista Gerald Cleaver e o contrabaixista John Hebert.
Estas três figuras, embora nem todos naturais de Nova Iorque (Cleaver é de Detroit e Hebert da Louisiana), constituem importantes nomes da música improvisada nova-iorquina. Figuras chave da “downtown music scene”, dispostas a contribuir, cada uma de forma marcadamente pessoal, para a construção desta viagem simbólica pelo espírito da cidade que nunca dorme, conduzida pelo saxofone de Amado.
Todos eles são tecnicistas exímios mas com uma apetência inegável pela experimentação, pela busca incessante de novas sonoridades e novas potencialidades musicais dos respectivos instrumentos. John Hebert tem sido aliás visita frequente no nosso país, depois de recentemente ter-se apresentado ao lado de Marc Copland, Michael Attias e Júlio Resende. Contrabaixista de enormes recursos, técnicos e estéticos, é peça fulcral deste improviso nova-iorquino pela irreverência e riqueza rítmica que imprime às suas apresentações. Gerald Cleaver alterna a força pujante dos ritmos afro-americanos com a subtileza textural da música contemporânea, complementando exemplarmente a irreverência rítmica do conjunto. Já nos metais ressalta o contraste. Por um lado a estética abstracta mas melódica do saxofone de Amado, onde o lirismo latino não consegue passar despercebido, mesmo por entre os milhões de apressados nova-iorquinos. Por outro a crua visceralidade do trompete de Bynum, sempre pronto a rasgar convenções e captar, nas mais pequenas nuances, caminhos novos a percorrer nesta busca de uma estética experimental, deste Adam na personificação de Amado, que também aparenta ser a sua.
O resultado, longe da heterogeneidade previsível, aparece pelo contrário unificado sob as fotos de Amado. Nova Iorque é a Big Apple, a cidade das mil luzes, onde todas as culturas, estéticas e raças confluem. Nova Iorque é heterogénea e improvisada como a música deste quarteto.
Por isso não tenho dúvidas em afirmar que senti a presença de Nova Iorque neste Searching For Adam, e isso parece-me o maior elogio que é possível fazer a este trabalho de Rodrigo Amado.

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