sexta-feira, 12 de setembro de 2008

EST, por Ulf Wakenius



Ulf Wakenius
Love Is Real
ACT, 2008

Ulf Wakenius nasceu em Halmstad, na Suécia, em Abril de 1958. Começou a tocar guitarra aos 11 anos de idade, influenciado sobretudo por outros guitarristas de Gotemburgo, onde residia. As suas primeiras influências musicais vêm do universo rock e blues. Nomes como Eric Clapton, Jack Bruce ou Johnny Winter aparecem entre as principais referências do guitarrista sueco, até que descobre John McLaughlin e a Mahavishnu Orchestra, o que origina uma mudança substancial na sua carreira rumo ao jazz.
Com 17 anos de idade já se tinha estabelecido como um guitarrista aclamado no jazz sueco. No início dos anos 80 fundou o duo “Guitars Unlimited” com Peter Almqvist, de grande sucesso na Suécia e com concertos em todo o mundo (em 1985 um programa antológico da carreira do duo foi visto por 600 milhões de espectadores!).
O passo seguinte de Wakenius levou-o ao Brasil, gravando um disco a solo no Rio de Janeiro e trabalhando com músicos como Sivuca, Luizão, Paolo Braga e Nico Assumpção (colaboradores regulares de artistas como Milton Nascimento e Elis Regina).
No final dos anos 80 Wakenous trabalhou com Niels-Henning Ørsted Pedersen, o virtuoso contrabaixista dinamarquês com quem gravou vários discos e correu o mundo em concertos (um deles oferecido ao presidente norte-americano Bill Clinton).
Já nos anos 90 fundou o grupo Grafitti, com o baterista Dennis Chambers, o contrabaixista Gary Grainger (ex-secção rítmica de John Scofield) e o teclista Haakon Graf. Colaborou ainda com o contrabaixista Ray Brown em dois trabalhos: Seven Steps To Heaven, gravado pela Telarc e Summertime, em que colaborou ainda o saxofonista Michael Brecker.
O seu talento levou-o a trabalhar com músicos de jazz tão importantes quanto os já mencionados e ainda Randy Brecker, Herbie Hancock, Steve Coleman, Joe Henderson, Phil Woods, Clark Terry, Johnny Griffin, Toots Thielemans, Jack DeJohnette, Max Roach, Jim Hall, Art Farmer, Benny Golson, James Moody, Roy Hargrove ou Milt Jackson. E, suprema honra, fez parte do quarteto de Óscar Peterson desde 1997, até à recente morte do mítico pianista canadiano, em Dezembro de 2007, ocupando o lugar anteriormente preenchido por guitarristas como Barney Kessel, Herb Ellis e Joe Pass. Com ele regressou ao Brasil onde teve oportunidade de actuar perante uma audiência de 35.000 pessoas, em São Paulo.
Os anos mais recentes de Ulf, coincidindo com o contrato assinado com a editora alemã ACT, caracterizaram-se por uma “cruzada melódica”, nas suas próprias palavras. Um regresso às origens.
No seu álbum de estreia pela ACT, Notes From The Heart, pegou na música de Keith Jarrett e arranjou-a, de modo redutor, para um trio de guitarra, em que apenas usou a guitarra acústica.


Neste trabalho, Love is Real, volta a pegar no repertório de um pianista, no caso do seu compatriota recente e precocemente falecido, Esbjorn Svensson, e volta a arranjá-lo para guitarra. Porém desta feita a preocupação não foi de redução mas antes de ampliação do universo musical dos EST. Wakenius usa várias guitarras, metálicas e de madeira, acústicas e eléctricas e chama ao ensemble o contrabaixo e violoncelo de Lars Danielsson, o piano de Lars Jansson e a bateria, caixa flamenca e percussão de Morten Lund. Conta ainda nalguns temas com a presença do radio.string.quartet.vienna, formado por Bernie Mallinger e Johannes Dickbauer no violino, Cynthia Liao na viola e Asja Valcic no violoncelo. Como convidados surgem ainda os trompetes de Till Brönner (no tema Seven Days of Falling), de Paolo Fresu (em Viaticum) e o trombone de Nils Landgren (em Good Morning Susie Soho). Conta ainda com a participação da guitarra eléctrica do filho, Eric Wakenius, no tema Dodge The Dodo.
Longe de uma estética redutora ou minimalista o tratamento de Wakenius à obra de Svensson é, pelo contrário, amplamente enriquecedora. Seja pelos elaborados arranjos introduzidos, visando a presença de um quarteto de cordas, da guitarra ou dos metais, não presentes nas versões originais, seja ainda pelo carácter menos intimista e compacto desses mesmos arranjos. Confesso que, nalguns deles, um seguidor da estética EST, como é o meu caso, continua fiel ao original (veja-se o arranjo mais cosmopolita de When God Created the Coffeebreak, por exemplo). Mas noutros sou forçado a reconhecer a valia introduzida por Wakenius com um trabalho amplamente meritório e rubricando solos e improvisações de grande classe que, ora lembram universos mais folk como o de Bill Frisell (por exemplo em Shinning on You ou sobretudo em Believe, Beleft, Bellow), ora exibem uma exuberância digna de John Scofield (como em Dodge the Dodo ou Good Morning Susie Soho), ora ainda acrescentam uma nota mais jazzística, evocativa de um John McLaughlin, aos temas ritmados dos EST, como em Seven Days of Falling ou Elevation of Love. Noutros ainda é o universo deconstrutivo de Svensson que é evocado com maestria e originalidade pela adição das cordas e dos metais, que elevam arranjos mais ou menos fiéis ao original, como em Tuesday Wonderland, Pavane “Thoughts Of A Septuagenarian”, Eighthundred Streets By Feet ou ainda Viaticum.
Um excelente trabalho que acaba por funcionar como uma merecida homenagem, ainda que imprevista (foi editado escassos dois meses antes da sua morte), ao original pianista sueco recentemente desaparecido (e que contribuiu ainda com um dos arranjos de cordas para o radio string quartet vienna, incluído neste trabalho de Ulf Wakenius).
O vídeo que se segue é do tema Believe, Beleft, Bellow (Love Is Real) interpretado em trio, com Ulf Wakenius na guitarra, Lars Danielsson no contrabaixo e Morten Lund na bateria. As fotos das ilhas britânicas são da autoria de Paul L-R.

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