Na sequência das ordens de expulsão dos judeus peninsulares, primeiro em 1492 pelos Reis Católicos de Espanha e mais tarde em 1497 pelo Rei Português D. Manuel, muitos procuraram refúgio em Itália, sobretudo em Nápoles onde estiveram sob protecção do Rei Fernando I e do seu sucessor Afonso II, mas também em Ferrara e na Toscânia. No entanto quando Nápoles caiu sob domínio espanhol, com Carlos V, foram novamente perseguidos e expulsos a partir de 1533. A maior parte da comunidade judaica acabou por concentrar-se na região de Ferrara, sob protecção do Duque Ercole II, onde se juntaram também os judeus genoveses, depois daquela cidade seguir o exemplo de Nápoles e ordenar a sua expulsão.
Mas a tradição judaica em Itália era já muito antiga (razão pela qual muitos judeus ibéricos rumaram àquela península), remontando ao período romano. Ao tempo de Teodorico, rei dos Ostrogodos e conquistador da Itália, existiam importantes comunidades judaicas em Roma, Milão, Génova, Palermo, Messina, Agrigento e na Sardenha.
Foi sobretudo durante os papados de Paulo IV e Pio V que as maiores perseguições aos judeus ocorreram, determinando o êxodo de grande parte das comunidades judaicas para oriente, sobretudo rumo a terras otomanas.
As comunidades italianas eram maioritariamente de rito sefardita, considerados livre-pensadores face aos ortodoxos cabalistas, pelo que a influência musical sefardita na península italiana já era há muito sentida, aquando da chegada dos judeus ibéricos.
Aliás importantes figuras do barroco italiano eram judeus ou descendentes de judeus como a família Bassano, liderada por Jerónimo Bassano, músicos venezianos que acabariam por se estabelecer em Inglaterra na corte de Henrique VII, Giacobbe Cervetto, violoncelista afamado, também ele emigrado para Inglaterra e próximo colaborador de Haendel, Salomon Rossi, compositor de madrigais da cidade de Mântua, contemporâneo e colaborador de Monteverdi ou ainda o famoso Lorenzo da Ponte, autor dos libretos das óperas de Mozart.
A ilustrar a influência judaica na música italiana vou deixar-vos um belo tema de Gianluigi Trovesi denominado Villanella.
A Villanella é uma forma musical nascida na primeira metade do séc. XVI em Nápoles (precisamente quando os sefarditas ibéricos chegaram e ali existia uma grande e próspera comunidade judaica). Este género influenciou fortemente as canzonettas e madrigais que, posteriormente, haveriam de difundir-se por toda a Europa. Antes porém a villanella tornou-se um dos géneros mais apreciados na Itália quinhentista, cultivada por compositores napolitanos como Giovanni Domenico da Nola, Giovan Tomaso di Maio ou, mais tarde, pelos não napolitanos Adrian Willaert, Luca Marenzio, Adriano Banchieri e Orlande de Lassus.
Gianluigi Trovesi é um saxofonista, clarinetista e compositor italiano nascido na Lombardia em 1944 (em Nembro, Bergamo). Aluno de Vittorio Fellegara tornou-se, desde os anos 70, um dos mais proeminentes e respeitados músicos do jazz italiano. A sua versatilidade tem-no levado aos mais variados contextos musicais, do clássico ao contemporâneo, da música renascentista ao serialismo, e do folclore italiano ao jazz improvisado. Nos seus discos mais recentes musicou Shakespeare, arranjou Kurt Weill para clarinete e acordeão e trouxe para o universo jazzistico os madrigais de Monteverdi e de vários outros compositores renascentistas.
Esta Villanella é um original seu, inspirado pela forma renascentista, onde são particularmente evidentes as influências judaicas e faz parte do disco “Al Tempo Che Fará” do contrabaixista Paolo Damiani (Egea, 2007). Além do contrabaixista (que aqui toca violoncelo) e de Trovesi no clarinete, podemos ouvir o argentino Javier Girotto no saxofone, o piano de Danilo Rea e a guitarra de Bebo Ferra. As fotos nostálgicas são da autoria de Jean-Luc Elias.
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