terça-feira, 28 de outubro de 2008

A Neve do Cáucaso



Stephan Micus
Snow
ECM, 2008

Stephan Micus tem um novo disco. O décimo oitavo editado pela ECM.
Fiel ao seu estilo inconfundível de reinventar as tradições musicais, o bardo alemão desta feita rumou ao Cáucaso, prosseguindo os seus estudos no canto coral georgiano e bem assim no duduk, um maravilhoso oboé, oriundo da Arménia, capaz de nos transportar à primeira nota para os trilhos da milenar rota da seda e das estepes da Ásia Central.
Mas como é seu apanágio isso não basta. A curiosidade e mestria de Micus permitiram-lhe elevar as potencialidades sonoras do instrumento. Fazendo uso de um duduk baixo, utilizado tradicionalmente para funções meramente rítmicas, explorou belas melodias inventadas ao sabor das sensações colhidas nas suas inúmeras viagens, acompanhadas por uma cítara da sua Baviera natal (em Midnight Sea), por címbales e gongos tibetanos e harpas africanas (em Snow) ou por gongos do Pacífico e cavaquinhos andinos (em For Ceren and Halil). O resultado é conhecido, chama-se a música de Stephan Micus e é verdadeiramente única no mundo!
O uso da voz, o instrumento que Micus reputa como mais difícil e que demorou anos a incluir nas suas gravações, aparece agora pleno de força e de expressão. No tema Almond Eyes, uma inspirada fantasia baseada nos coros tradicionais búlgaros e georgianos, Micus simula um ensemble de onze vozes, todas interpretadas e arranjadas por si. O resultado é uma maravilhosa balada, acompanhada por uma guitarra tradicional de cordas de aço e por um "maung", gongo oriundo de Burma, que ora parece uma versão masculina das magistrais obras do grupo Le Mistére des Voix Bulgares, ora descobre nos solos instrumentais uma orientalidade inesperada mas profundamente bem vinda.
Em Brother Eagle, o tema que fecha o disco, são quinze as vozes clonadas de Micus que se sobrepõem num tema misterioso e perturbador e onde o duduk baixo reaparece imponente, qual saxofone nas mãos de um Jan Garbarek, também ele um conhecido cultivador destas sonoridades primordiais.
Nas mãos de Micus todos estes instrumentos tradicionais modificados ganham vida (o próprio músico afirma que os seus inúmeros instrumentos adquirem uma personalidade própria quando integram a sua colecção, deixam de ser meros objectos para constituírem uma personificação do som que produzem).
Através de um intenso e solitário trabalho de estúdio, levado a cabo pelo alemão na sua casa em Maiorca, permitem-lhe atingir um resultado final que é verdadeiramente crescente e orgânico. A música de Stephan Micus é como um organismo criado no seu laboratório de sons, a partir de fatias de sonoridades importadas das mais variadas regiões do mundo, e que, uma vez libertado em disco, se entranha e desenvolve no espírito dos ouvintes, incutindo bem estar e tranquilidade.
Uma experiência viciante e vivamente recomendada.
Vejam um vídeo elaborado a partir do tema Midnight Sea, interpretado no duduk e na cítara bávara, com fotos da Turquia e do Mar Negro da autoria de Brian Lai e que podem ser visitadas em http://www.pbase.com/brian_lai/turkey.
Para mais informações sobre este extraordinário músico alemão podem ler a minha crítica ao disco Desert Poems bem como visitar a página do músico no sítio da ECM em http://www.ecmrecords.com/Catalogue/Artists/micus_stephan.php.

Midnight Sea

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