terça-feira, 4 de novembro de 2008
Cristóbal Repetto na Culturgest
Cristóbal Repetto
4 de Novembro de 2008, 21.30h
Grande Auditório da Culturgest, Lisboa
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“Dizem que só a partir dos 30 se pode cantar o tango. Mas eu venho de um país onde se sofre muito antes dos 30…”
Cristóbal Repetto ainda não tem 30 anos e já há muito que canta o tango. Não o tango galante e marialva de Gardel, mas o tango campesino, que se toca e sente nos bailes dos pueblos das pampas argentinas, onde nasceu há 29 anos. Cresceu rodeado de música. De velhas cassetes que tocavam as mágoas de viver, cantadas por grandes músicos populares argentinos como Jorge Cafrune, Mercedes Sosa, Violeta Parra, Ignacio Corsini, Roberto Goyeneche e claro está, também por Carlos Gardel. Absorveu como uma esponja esse profundo fado argentino e, logo que pôde, foi cantá-lo para as peñas e festividades locais. Daniel Melingo descobriu-o e levou-o para os palcos de Buenos Aires e depois do mundo. Dele disse Gustavo Santaolalla: “Tiene todo el aspecto de um pibe moderno, pero quando abre la boca suena como un vinillo de los años 30, los de 78 revoluciones por minuto”.
Repetto é um fenómeno. A verdadeira personificação do tango enquanto fenómeno cultural popular. Teatral, deliberadamente maneirista, propõe uma exótica viagem ao passado. Ao início do século XX, quando o tango surgiu possante nos cabarets de Buenos Aires e iniciou a sua expansão triunfante para a Europa e para o mundo.
O seu repertório evita deliberadamente os ícones. Repetto não quer ser o novo Gardel, objectivo inatingível e demasiadas vezes procurado. Ele quer ser apenas um embaixador do verdadeiro tango popular, aquele que brotou espontaneamente do cruzamento de culturas na Argentina do início do século XX e se inscreveu no imaginário popular de tantos povos, incluindo o nosso.
Por isso não se limita a cantar o tango. Vai redescobrindo as suas origens, pondo-as a nú. E conduzindo o ouvinte nessa viagem pelos primórdios da canção nacional argentina, cantando habaneras, milongas e canyuenges.
Cristóbal Repetto insere-se também num movimento cultural que tem nos seus cultores nomes como Rufus Wainwright, Antony Hegarty, Edson Cordeiro ou os nossos Nuno Guerreiro e Paulo Bragança. Símbolos que vivem a arte à flor da pele e assumem, na teatralidade dos seus gestos, na colocação da voz, no assumir dos maneirismos associados à música e ao revivalismo do repertório, valores culturais de referência, responsáveis pelo surgimento de um universo musical gay que se tem imposto e adquirido um número crescente de adeptos junto dos mais variados públicos.
A acompanhar Repetto na Culturgest esteve apenas a guitarra de Ariel Argañaraz. Um grande guitarrista que conseguiu sozinho assegurar as despesas de um espectáculo manifestamente exigente. O tango que nos habituámos a ouvir acompanhado pelo bandaneón, ou ainda pelo piano, não surgiu minimamente beliscado por tão singelo acompanhamento. Nas mãos de Argañaraz a guitarra descobriu sonoridades inusitadas, bem como toda a emoção associada aos famosos cortes e quebradas tradicionais do tango. Outra exibição de grande virtuosismo.
Um grande espectáculo de dois músicos de que ainda iremos ouvir falar muito…
El Tabernero
Organito
Acquaforte
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