terça-feira, 10 de junho de 2008

Onanismo Musical


Twines of Colesion
Michaël Attias Quintet

9 de Junho de 2008, 21.30h
Pequeno Auditório da Culturgest (Lisboa)
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Pedro Costa propôs-nos mais uma provocação com este Twines of Colesion. Partindo de uma formação clássica em quinteto de jazz (aos dois saxofones de Michael Attias e Tony Malaby, juntou-se o piano de Russ Lossing, o contrabaixo de John Hebert e a bateria minimal de Satoshi Takeishi) este grupo liderado pelo israelita Michael Attias deconstrói o jazz.
Apesar de todos eles possuírem sólida formação jazzística, Attias foi aluno de Lee Konitz e tocou com músicos tão importantes quanto Marc Ribot, Anthony Coleman, Marc Helias, Paul Motian ou Tom Rainey, Malaby foi membro da Liberation Music Orchestra de Charlie Haden, Lossing tem formação clássica e tocou com Dave Liebman, Mat Maneri ou Mark Dresser, Hebert trabalhou décadas com Andrew Hill e faz parte da Maria Schneider Orchestra e Takeishi com Ray Barretto, Anthony Braxton, Randy Brecker ou Rabih Abou-Khalil, o seu trabalho viaja pelas fronteiras musicais, particularmente pelas do jazz.
Não se trata aqui de buscar a ressonância natural do cosmos, como em Sei Miguel, mas antes de pegar nas sonoridades tradicionais do jazz e revertê-las, abdicando quase integralmente da melodia, e construindo sucessivas harmonias e ritmos, que embora ambientais, evocam inequivocamente o universo do jazz e ocasionalmente também a música do médio oriente (ou não fosse Attias israelita de ascendência marroquina).
Para tal fazem uso dos seus esplêndidos dotes técnicos e sem nunca cair no minimalismo. A música de Attias é cheia e preenchida, pelos seus solos virtuosos no sax alto, pelos de Tony Malaby no sax soprano e tenor, pelas soberbas improvisações de Hebert no contrabaixo e pelas poderosas arrancadas de Takeishi na bateria (que apesar de minimalmente composta por uma caixa, um bombo e dois pratos, produz mais ritmo do que um concerto de hard rock!). Apenas a presença de Russ Lossing no piano teve laivos de minimalismo, com uma abordagem mais conceptual e contemporânea, claramente complementar relativamente aos restantes músicos e rejeitando intencionalmente o protagonismo (que ainda assim surgiu em dois ou três solos interessantes).
O resultado é interessante mas talvez demasiado cerebral… Ocasionalmente o jazz emerge deste anti-ensemble, enérgico e vivo, apesar de puramente ambiental. No entanto não posso deixar de pensar como soariam estes excelentes músicos em circunstâncias menos conceptuais (aliás não é preciso pensar muito pois todos eles tocam inseridos em diferentes projectos e ainda recentemente admirei as qualidades de Hebert integrado no quarteto de Marc Copland).
O experimentalismo é essencial no processo criativo. Ele permite abrir novos caminhos ao desenvolvimento musical. Mas se levado ao limite, cristalizado numa linguagem musical puramente conceptual, torna-se frio e cerebral. Vira-se para o próprio umbigo do intérprete/criador e falha no contacto com o público, razão última e essencial da criação artística.
Aplaudo a ousadia e o talento destes músicos, todos eles soberbos tecnicistas dos respectivos instrumentos. Preferiria contudo apreciá-las, ainda que recorrendo a muitos dos elementos experimentais testados neste Twines of Colesion, num ambiente mais melódico e porventura convencional…
Talvez desse menos “pica” aos músicos, mas o público seguramente agradecia.
Tocado assim o jazz converte-se num mero prazer onanístico dos músicos…

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