domingo, 31 de maio de 2009

Jazz nos Capuchos 2009



Encontros de Jazz de Almada, 2009

Almada recebe a 4, 5 e 6 de Junho o 2º Jazz nos Capuchos - Encontros de Jazz de Almada. Os concertos principais estão marcados para o Convento dos Capuchos, na Caparica, enquanto a Incrível Almadense, em Almada, recebe os concertos after-hours. Os Encontros de Jazz de Almada são uma organização conjunta da Câmara Municipal de Almada e do JACC - Jazz ao Centro Clube, em parceria com a Associação Piajio.


Abe Rábade Trio
Quinta-feira, 4 de Junho de 2009, 21.45h
Convento dos Capuchos

Abe Rábade - piano e composição
Pablo Martín Caminero - contrabaixo
Bruno Pedroso - bateria

Não é fácil arrumar o pianista e compositor Abe Rábade numa área específica do jazz, e é isso mesmo que explica o encanto provocado pela sua música. Se formalmente adere ao hard bop, na linha de um Ahmad Jamal e de um Hank Jones, o seu gosto pelas melodias populares da Galiza e pelo cancioneiro medieval faz-se sentir de alguma forma, e por vezes até explicitamente, adoptando ainda algumas estruturas-tipo do classicismo camerístico, como a suite. Além do mais, não é invulgar que trabalhe directamente com as cordas do piano, um recurso que regra geral é conotado com as práticas vanguardistas. Some-se isto à sua clara preferência pela balada e por situações musicais introspectivas e temos o retrato de um músico não-conformista e alheio a estereótipos.

As afinidades que o pianista vai cultivando com uma pluralidade de músicos, permitem-lhe explorar diferentes abordagens, tendo em mente diferentes instrumentistas. Os lugares entregues a Paco Charlín (contrabaixo) e a Ramón Ángel (bateria) numa primeira fase do trio de Abe Rábade, passaram a ser ocupados pelos portugueses Nelson Cascais (contrabaixo) e Bruno Pedroso (bateria). A formação que se irá apresentar no Convento dos Capuchos mantém Pedroso na bateria, mas no contrabaixo veremos Paco Martín Caminero, reconhecido pelo seu trabalho na confluência do jazz e do flamenco. Motivo de curiosidade adicional será, portanto, a forma como Paco Martín e Bruno Pedroso irão explorar o espaço improvisacional que o pianista concede aos seus companheiros.

Novos caminhos do jazz feito na Península Ibérica, a descobrir no concerto inaugural do Jazz no Capuchos.


LA Jumping Pulgas
Quinta-feira, 4 de Junho de 2009, 23.45h
Incrível Club (Antigo Cine-Teatro da Incrível Almadense)

Lars Arens - trombone, eufónio, composição
Mário Delgado – guitarra
Bernardo Moreira – contrabaixo
Bruno Pedroso – bateria

No repertório deste grupo luso-alemão, abandona-se o conceito musical do jazz tradicional, em que um tema é composto pela melodia que se faz acompanhar por uma estrutura harmónica seja funcional ou modal, que a seguir serve também como forma para os improvisos.
Ao contrário de outros pequenos grupos de jazz convencionais, na música deste quarteto é a composição e o arranjo escrito que ganham mais espaço, sendo elementos preponderantes nos temas, exclusivamente originais – sem todavia restringir as várias partes do improviso.


Trio DAG
Sexta-feira, 5 de Junho de 2009, 21.45h
Convento dos Capuchos

Sophia Domancich - piano
Jean Jacques Avenel - contrabaixo
Simon Goubert - bateria

O trio de piano jazz faz-nos lembrar imediatamente uma pirâmide, com o piano situado no centro e destacado relativamente à secção rítmica, mas o certo é que com o DAG de Sophia Domancich, Jean-Jacques Avenel e Simon Goubert outras geometrias se vão proporcionando. Seja através de variações inesperadas do modelo estabelecido por Bill Evans para este formato instrumental, como por irreverentes trocas de papéis entre os intervenientes. Independentemente das mutações realizadas, a música é conversacional, reactiva e tensa, com o balanço do “swing” mas maior liberdade do que a encontrada nas práticas jazzísticas com parâmetros rítmicos muito definidos.

A nível estético, Domancich e os seus parceiros situam-se entre o bop (há algo de Thelonious Monk nas sincopações quebradas da pianista e compositora) e o free, mas pressentem-se muitos outros ingredientes, alguns deles derivados da formação clássica da líder e do seu gosto pela música de câmara contemporânea. Virá certamente daí a senda exploratória do projecto DAG, curioso sendo que mesmo nas improvisações se recorra a repetições de motivos. Cada peça tocada é uma desconstrução dos seus elementos, com o fito de juntar estes numa sucessão de novas formas. O cunho é, regra geral, melancólico, mas nunca se subjuga aos estereótipos da balada.

Muito diferencia este grupo da generalidade do jazz francês, seja pelas ligações de Sophia Domancich à cena britânica, na qual partilhou outro trio com Paul Rogers e Tony Levin, como pelo facto de, durante muitos anos, o contrabaixista Jean-Jacques Avenel ter tocado com Steve Lacy e de o baterista Simon Goubert seguir um percurso de colaborações transnacionais que vai de Joachim Kuhn a James Carter, passando por Lee Konitz. Até por esta circunstância estamos perante um caso de bem-vinda singularidade.


Daniel Levin Quartet
Sexta-feira, 5 de Junho de 2009, 23.45h
Incrível Club (Antigo Cine-Teatro da Incrível Almadense)

Nate Wooley - trompete
Daniel Levin – violoncelo
Mat Moran – vibrafone
Peter Bitenc – contrabaixo

Com carácter de câmara (sem bateria, o que lhe dá maior liberdade ao nível da gestão dos tempos, dos espaços e das dinâmicas) e vocação improvisacional, o Daniel Levin Quartet alia as configurações do jazz com as perspectivas que nos chegam da música erudita desde Anton Webern. A esse molde adiciona ainda uma sólida aplicação das técnicas extensivas de exploração dos instrumentos em presença, assim ampliando as possibilidades da música que pratica. O curioso é que as partituras-base do quarteto são escritas pelo violoncelista Daniel Levin tendo a voz como referência e não o seu cordofone, o que em muito contribui para a dimensão humana e orgânica do projecto. E bem servido este está: nos EUA, Levin conta apenas com a concorrência de Fred Lonberg-Holm, Erik Friedlander e Tomas Ulrich nos domínios da improvisação, Nate Wooley impôs-se como um inovador radical do trompete, Matt Moran é conhecido por ter expandido a paleta sonora do vibrafone de forma muito pessoal e Peter Bitenc é o exemplo acabado do contrabaixista que atravessa fronteiras de estilo e idioma. Com tal junção de cabeças e talentos o inevitável, decerto, acontecerá: um grande concerto…


Peter Brötzmann Quartet
Sábado, 6 de Junho de 2009, 22:00
Convento dos Capuchos

Peter Brötzmann - saxofones alto e tenor, tarogato, clarinete
Joe McPhee - saxofones tenor e soprano, trompete
Kent Kessler - contrabaixo
Michael Zerang - bateria e percussão

O novo quarteto de Peter Brotzmann é inteiramente retirado do seu Chicago Tentet, e se com este formato já não se pode falar em “massa sonora”, o certo é que as ferramentas utilizadas lidam igualmente com as noções de “intensidade” e “densidade”, de resto imagens de marca do saxofonista e clarinetista alemão. A esse nível, temos aqui uma pequena “big band”, pois com pouco é capaz dos investimentos mais épicos.

Épica, precisamente, é desde sempre a música de Brotzmann. O seu catártico “Machine Gun” surgiu em pleno período de guerrilha urbana na Europa, com especial incidência na Alemanha (Baader-Meinhof) e em Itália (Brigadas Vermelhas). “Fuck the Boere” é um violento libelo contra o sistema de apartheid na África do Sul. “Nipples” e “Balls” representam uma provocadora afirmação da sexualidade. “The Nearer the Bone, the Sweeter the Meet” lembra a condição animal dos seres humanos. Radical, agressiva, por vezes até virulenta, foi esta música que levou à definição do free jazz europeu, e em especial do germânico, como “estética do grito”. Uma forma de protesto sem palavras, expressão de raiva e inconformismo, mas capaz também de alguma ternura e até de lirismo.

Se a matriz deste quarteto é europeia e remonta aos anos 1960 e 70, foi com músicos americanos que Peter Brotzmann o constituiu, em resultado (um de muitos) da sua aceitação na cena “hard” de Chicago desde a década de 1990. A participação de Joe McPhee tem, neste contexto, uma enorme relevância simbólica, dado o seu envolvimento no free jazz original e na luta dos negros pelos direitos civis. Bastante mais jovens do que os homens dos sopros são Kent Kessler e Michael Zerang, este proveniente de uma família de origem iraquiana que viveu mal o período de governação de George W. Bush: ambos ritmistas possantes, têm a característica de saber saltar para fora da pulsação sem que tal signifique a entrega a rendilhados sonoros. Nesse aspecto, são muito diferentes de grande parte dos improvisadores do Velho Continente. É como se o jazz, depois de se ter deslocado dos Estados Unidos para a Europa, tivesse voltado ao ponto de partida.

Mais informações em http://www.jazznoscapuchos.com/2009/?language=pt

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