domingo, 31 de janeiro de 2010

Rasta Blues


Corey Harris & The Rasta Blues Experience
30 de Janeiro de 2010, 21.30h
Grande Auditório da Culturgest (Lisboa)

Apesar de ainda jovem, acabou de dobrar os quarenta, Corey Harris tornou-se uma referência na música norte-americana, muito por culpa do modo como abordou as suas raízes, particularmente as raízes negras e africanas do blues.
Antropólogo de formação, Harris viveu e estudou nos Camarões e no Mali, locais onde saciou a sua busca pessoal pelas raízes linguísticas e rítmicas da cultura afro-americana, nomeadamente com a grande guitarrista maliano, recentemente falecido, Ali Farka Touré, com quem gravaria, em 2003 para a Rounder, um grande disco de blues “Mississippi to Mali”.
Foi esta incessante busca da história do blues, um caminho meticulosamente seguido por Harris, que fez dele um dos mais inspirados guitarristas acústicos da sua geração, facto reconhecido por Martin Scorsese ao granjear-lhe o papel de protagonista num episódio da sua belíssima série “The Blues”, produzida em 2003 para a PBS (o episódio inicial da série, denominado “Feel Like Going Home”, realizado pelo próprio Scorsese e com Ali Farka Touré, Salif Keita, Son House, Taj Mahal, Keb Mo’ e outros mestres a partilharem o ecrã com Harris).
Mas nos últimos anos assistimos a uma viragem na carreira musical de Corey Harris. O seu desejo de investigar a história da música negra levou-o à Jamaica e ao encontro do Reggae.
Os seus dois últimos trabalhos discográficos para a Telarc, Zion Crossroads (2007) e blu.black (2009) foram gravados com recurso a músicos jamaicanos e fortemente influenciados pela filosofia e estética do Reggae, notória aliás na visível conversão do guitarrista ao Rastafarianismo.
A música de Harris ressentiu-se desta mudança. O blues histórico e acústico de álbuns anteriores deu lugar a uma estética eléctrica e de fusão que inclui elementos oriundos do delta blues, do Chicago blues, do zydeco, mas também das Caraíbas, particularmente do reggae jamaicano. Pelo meio sentem-se ainda algumas referências à música tradicional do noroeste africano.
O resultado, ainda que interessante, não deixa por isso de desiludir um pouco os amantes de blues, que viram em Harris um dos seus mais promissores executantes no início do século.
Por outro lado a sua inclusão como prato principal do ciclo Hootenanny, uma homenagem da Culturgest ao blues, não deixa por isso de ser um pouco paradoxal, na medida em que Harris se mostra actualmente pouco vocacionado para tocar o blues.
Ainda assim tivemos oportunidade de ouvir uma mão cheia de blues, três deles com Harris sozinho em palco e acompanhado apenas pela sua guitarra, numa concessão do guitarrista ao espírito da iniciativa da Culturgest que, claramente, constituiu o momento mais alto da noite.
Com a sua Rasta Blues Experience, Harris vagueou por entre o Reggae de Bob Marley e o Blues de Muddy Waters, com algumas interessantes incursões em territórios menos óbvios como o zydeco, o soul, o rhythm & blues ou o folk afro-americano, numa viagem mais abrangente que empolgante pelo legado musical da América negra.
Revelou contudo um saxofonista de enorme valia, Gordon T. Jones, que não posso deixar de destacar.
Faço votos pelo regresso rápido de Harris ao blues, o território musical em que verdadeiramente é um mestre e que levou algumas centenas de pessoas a ouvi-lo na Culturgest.

Corey Harris – Honeysuckle


Corey Harris - Special Rider Blues


Gordon T. Jones, com a DJ Williams Projekt

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