domingo, 14 de dezembro de 2008

Conta-me Histórias



Quarteto Marta Hugon
13 de Dezembro de 2008, 23.00h
Hot Club de Portugal (Lisboa)
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Esta semana foi a vez do Quarteto de Marta Hugon subir ao palco do Hot, para um triplo concerto nos dias 11, 12 e 13 de Dezembro. Formado exclusivamente por ex-alunos e docentes da Escola de Jazz Luís Villas Boas do Hot Club de Portugal (Marta Hugon faz mesmo parte dos corpos directivos desta instituição), pode dizer-se que este Quarteto se apresentou em casa, o que foi notório no modo descontraído como decorreu a apresentação de Sábado, nomeadamente quando comparada com a recente presença no Seixal Jazz, de que já vos dei conta oportunamente.
Com apenas dois discos editados, Tender Trap em 2006 e Story Teller este ano, esta formação ganhou já uma rara popularidade, fruto da coerência do seu repertório, da forma inteligente como se apropria de património musical estranho ao universo do jazz e, claro está, das inegáveis e enormes qualidades dos seus membros. Marta Hugon possui uma das mais doces e seguras vozes do jazz nacional, personalizada, expressiva e muito bela (à sua semelhança, aliás). Filipe Melo é uma referência no piano e nos arranjos, um dos mais talentosos músicos portugueses da sua geração, responsável pelo enorme swing que brota da música desta formação e pelos inconfundíveis riffs de blues que, a propósito, povoam os sons do quarteto. Mas a consistência da música de Marta Hugon passa também, e muito, pela enorme classe e experiência da sua secção rítmica, formada pela omnipresença de Bernardo Moreira no contrabaixo e pelo vigor de André Sousa Machado na bateria. Nos dois primeiros concertos esteve igualmente presente André Fernandes na guitarra, o quinto elemento do grupo cuja presença em estúdio enriqueceu fortemente a gravação de Storyteller (o sexto membro em estúdio foi o trompetista João Moreira, que contudo não costuma apresentar-se frequentemente em palco com o quarteto).
Esta apresentação serviu ainda para dar a conhecer alguns temas novos, porventura preparados a pensar na gravação, para breve, de um terceiro disco. Aqui notou-se a continuada apropriação do grupo de temas oriundo do universo musical do rock independente. Depois das adaptações de River Man de Nick Drake e de Crash Into Me de Dave Matthews (ao qual poderíamos juntar Still Crazy After All These Years de Paul Simon) surgem agora versões de David Sylvian, dos Radiohead e, facto importante, a estreia de um original de André Fernandes, com letra de Marta Hugon, denominado Time.
O jazz standard é um conceito evolutivo. Por mais geniais que sejam os clássicos de George Gershwin, de Cole Porter ou de Rodgers e Hammerstein, cada geração possui as suas próprias referências. Nada mais natural portanto que utilizá-las na construção da sua identidade musical, residindo aí grande parte da apelatividade do jazz: nessa enorme capacidade de integração em qualquer universo musical; na intemporalidade da sua linguagem.
Está pois no bom caminho a música de Marta Hugon. A prová-lo esteve este concerto memorável, com direito a dois encores, consagração absoluta perante o exigente público do Hot.

Marta Hugon - River Man

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