domingo, 1 de novembro de 2009

Ecletismo


Brad Mehldau Trio
29 de Outubro, 21.00h
Grande Auditório do CCB (Lisboa)

Brad Mehldau é um fenómeno de popularidade entre a comunidade jazzística e não só. A ponto de justificar uma mini tour nacional de quatro concertos noutros tantos dias.
Precoce nos estudos, começou a tocar piano aos seis anos de idade. Passou da formação clássica para o jazz aos 14 anos de idade. Foi aluno de Kenny Werner, Junior Mance e Fred Hersch, na Berklee College of Music e na New School for Jazz & Contemporary Music, onde completou a sua formação académica. Ainda estudante foi convidado por Jimmy Cobb para integrar a sua banda, seguindo-se colaborações com Joshua Redman, Charlie Haden, Lee Konitz, e gravações com Wayne Shorter, John Scofield e Charles Lloyd, entre muitos outros. Fundou o seu trio em 1995, com Larry Grenadier no contrabaixo, que se mantém até ao presente, e Jorge Rossy na bateria, mais tarde, em 2005, substituído por Jeff Ballard. Logo ao segundo registo discográfico o trabalho do trio foi nomeado para os Grammys, em 1997.
Parte da enorme popularidade da formação reside no facto de, além dos habituais jazz standards, incluir no seu repertório versões de temas de rock, de músicos como Nick Drake, The Beatles, Radiohead, Paul Simon ou Soundgarten. Outros já o fizeram, mas poucos com o brilhantismo de Brad Mehldau. Também a música brasileira tem seduzido o pianista norte-americano, particularmente as obras de Milton Nascimento, Chico Buarque e Simone, que não hesita em comparar com Sarah Vaughan ou Dinah Washington.
Com uma sólida formação clássica, a música de Mehldau bebe igualmente inspiração no universo erudito, particularmente em Schubert, nisto se aproximando do jazz europeu, que cruza habitualmente as fronteiras musicais, misturando uma estética contemporânea com a técnica jazzística.
Mehldau afigura-se assim como uma ponte entre uma certa visão mais conservadora do jazz norte-americano e o vanguardismo conceptual. Mehldau tenta reunir o melhor dos dois mundos numa tarefa difícil e que frequentemente suscita críticas. Entretanto atrai públicos diversos, conseguindo mesmo seduzir alguns amantes do rock.
A sua técnica brilhante e o recurso a compassos pouco usuais fazem dele contudo uma referência incontornável, que muitos ousam mesmo comparar a Bill Evans.
Esta apresentação no CCB foi a confirmação dos predicados atrás descritos. Tecnicamente brilhante, Mehldau cultiva com o público jazzístico uma relação de amor-ódio que brota precisamente da escolha pouco habitual do repertório e da facilidade com que salta da estética puramente jazzística para o pop e para o clássico. Ao lado de temas de Charlie Parker surgem belíssimas versões de Chico Buarque, de Nick Drake ou dos Radiohead, sem esquecer uma fantástica suite desenvolvida a partir de Sound of Music de Rodgers & Hammerstein.
Um ecletismo que sempre caracterizou a sua música e que está na base da enorme popularidade do pianista, capaz de comunicar com os mais variados públicos e gerações.
Nunca defendi fundamentalismos e só vejo razões para felicitar Mehldau pela diversidade e riqueza da sua obra. Um músico de excepção capaz de revelar o brilhantismo do seu talento no que quer que toque.
Magnificamente acompanhado pelos dois membros habituais do seu trio, apresentou-se em grande forma e com uma entrega notável à apresentação, coroada com uns inusitados cinco encores (sim, não me enganei, foram mesmo meia dezena!), que elevaram a duração do concerto para quase duas horas e meia!
Um privilégio.

Brad Mehldau - River Man


Brad Mehldau Trio - Fifty Ways To Leave Your Lover

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