quinta-feira, 20 de maio de 2010

Ivey Divey


DON BYRON IVEY DIVEY TRIO
8 de Maio, 22.00h
Auditório Municipal Eunice Muñoz (Oeiras)
Som da Surpresa, Ciclo Internacional de Jazz de Oeiras

Byron é um reconhecido conceptualista, capaz de abraçar com igual entusiasmo os mais diversos géneros musicais, do klezmer ao rap, passando pelas lieder alemãs e, claro está, pelo jazz nas suas mais diversas acepções.
Este projecto Ivey Divey surgiu em 2004, como homenagem ao saxofonista Lester Young (ao que parece ivey divey era uma das suas excêntricas tiradas em calão hipster) e ao trio que este manteve, nos anos 40, com Buddy Rich e Nat Cole (Byron gosta de precisar que nesta altura ainda ninguém lhe chamava “king” e era um dos mais brilhantes pianistas da sua geração).
Ao lado de Byron, no disco que gravou para a Blue Note, surgiram então a jovem promessa Jason Moran no piano e o veterano Jack de Johnette na bateria.
Em Oeiras, apresentou-se ao invés ao lado do consagrado Uri Caine no piano e do jovem Tony Jefferson na bateria.
Começando pelo fim direi que Jefferson, sem desiludir, esteve contido e compenetrado no seu papel de aluno bem comportado, num espectáculo onde o protagonismo competia por completo a Byron e Caine. É um baterista de inegáveis recursos e talento, mas nem esteve visivelmente à vontade com o repertório do clarinetista, nem quis aventurar-se muito em seara alheia…
Caine foi, em contrapartida, um complemento perfeito para o clarinetista e saxofonista do Bronx. Também ele um exemplo perfeito do virtuoso eclético (ainda há cerca de um ano atrás o vi no CCB a interpretar as Goldberg Variations -vagamente inspiradas nas de Bach-, ao lado de Ben Perowski e John Hebert, num supremo esforço de contenção face à chocante exuberância da sua gravação para a Winter & Winter) capaz de se atirar com a mesma vontade a Gustav Mahler, John Zorn ou ao klezmer de Mickey Katz.
Foi, para mim, a estrela da noite, assinando uma exibição brilhante a todos os níveis.
Mostrou uma técnica de outro mundo e uma notável capacidade de improvisação e de interpretação do projecto de Byron. Capaz de tomar a iniciativa, quando tal se mostrou pertinente, proporcionou no entanto um apoio notável nos solos e improvisações do saxofone e clarinete. Mais do que um sideman, foi um verdadeiro parceiro do projecto, mostrando conhecimento profundo do repertório e um notável entendimento com o seu líder.
Don Byron esteve igual a si mesmo. Um tecnicista notável incapaz de maneirismos. Mesmo num projecto de homenagem e onde abundam os standards, Byron não se cinge a reinterpretar o património musical de Porky Pie Hat: reinventa-o com a mesma ousadia com que Caine “profanou” Bach. E claro, não resistiu a intercalar algumas composições da sua lavra com um requintado sentido de ironia.
Ivey Divey é assim um projecto difuso, onde há ecos de bebop, de blues, de Count Basie e de Nat King Cole, mas como que misturados num explosivo cocktail free jazz, com ecos de barroco e de melodrama hollywoodesco à espreita.
Uma irreverência servida com requinte por dois músicos brilhantes que fizeram dela a sua imagem de marca.

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