domingo, 29 de agosto de 2010

Jazz na Nova Temporada da Culturgest



Há jazz de enormíssima qualidade na nova temporada da Culturgest, que irá decorrer até ao final do ano.
Logo em 16 de Setembro e no grande auditório lisboeta, o contrabaixista Nelson Cascais irá ter a oportunidade de apresentar o seu mais recente trabalho, Guruka, ao lado dos grandes nomes do jazz nacional, Pedro Moreira, João Paulo e André Fernandes, e bem assim do baterista espanhol Iago Fernandez. Destaca-se ainda a inesperada participação da cantora Rita Maria.
No mês seguinte, logo no dia 7, irá apresentar-se, também no grande auditório em Lisboa, o original trio As Soon as Possible, composto pela pianista helvética radicada nos Estados Unidos Sylvie Courvoisier, pelo saxofonista norte-americano Ellery Eskelin e pelo violoncelista francês Vincent Courtois.
Em Novembro apresentar-se-á o sexteto Saxophone Summit, onde pontificam três dos maiores saxofonistas do seu tempo: Joe Lovano, Dave Liebman e Ravi Coltrane. Ao seu lado o piano de Phil Markowitz, a bateria de Billy Hart e o baixo de Cecil McBee. Um concerto que promete!
Continuando o ciclo Isto é Jazz?, comissariado por Pedro Costa para o pequeno auditório, actuarão a 26 de Novembro os portugueses Paulo Curado, Miguel Mira e Carlos Zíngaro. Um espaço dedicado à música improvisada nacional. A 10 de Dezembro será a vez de Jorge Lima Barreto, Jonas Runa e Eddie Prévost apresentarem o projecto Zul Zelub liderado pelo pianista e musicólogo português, onde o jazz e a música improvisada se fundem com a electrónica.
Motivos de sobra para os jazzómanos se deslocarem ao espaço cultural da CGD.


Nelson Cascais
Guruka
SEX 17 DE SETEMBRO, 21.30h
Grande Auditório – Lisboa

Contrabaixo Nelson Cascais
Saxofones Pedro Moreira
Guitarra André Fernandes
Piano, Fender Rhodes João Paulo
Bateria Iago Fernandez
Artista convidada Rita Maria (voz)

Representando a geração dos músicos de jazz portugueses que afirmaram as suas brilhantes qualidades já em pleno século XXI – muito embora viessem já de uma fase imediatamente anterior as suas actividades musicais no âmbito da Escola de Jazz Luiz Villas-Boas (do Hot Clube de Portugal) e as primeiras actuações ao vivo à luz de uma primeira passagem para a actividade profissional, frequentemente desenvolvidas na pequena cave (entretanto desaparecida) daquele histórico clube – Nelson Cascais é hoje um dos músicos mais admirados na cena do jazz actual português, não apenas como instrumentista bastante solicitado para formações instrumentais de diverso tipo, estéticas díspares e lideranças também diferenciadas mas ainda como compositor de primeira ordem e de grande maturidade conceptual. Tendo publicado no ano passado o seu terceiro álbum em nome próprio – Guruka – que cronologicamente se seguiu a outros dois primeiros prometedores opus discográficos – Cíclope (2002) e Nine Stories (2005) – Nelson Cascais afirmou-se, definitivamente, como um “autor” com identidade própria, recusando as facilidades e as familiaridades fáceis de um jazz repisando os velhos esquemas tema-variações-tema, procurando que a vertente da composição fosse cuidadamente desenvolvida, com isso estimulando, sem margem para dúvidas e jamais coarctando, as intervenções criativas individuais dos restantes componentes e notáveis solistas que compõem o seu quinteto: Pedro Moreira (saxofones), André Fernandes (guitarra), João Paulo (piano e teclados) e Iago Fernandez (bateria). Sendo provável que o repertório do concerto que apresentará na temporada deste ano da Culturgest se baseie em algumas das melhores peças que fizeram de Guruka um dos mais exaltados álbuns portugueses do ano passado, é também natural que, passado este tempo, novas peças sejam agora apresentadas em palco por Nelson Cascais, desde já se aguardando nesse novo repertório a revelação de uma voz convidada: a cantora Rita Maria.

Nelson Cascais Quinteto - Radio Beat



As Soon as Possible
Vincent Courtois, Sylvie Courvoisier, Ellery Eskelin
QUI 7 DE OUTUBRO, 21.30h
Grande Auditório – Lisboa

Violoncelo Vincent Courtois
Piano Sylvie Courvoisier
Saxofones Ellery Eskelin

O simples enunciado de três nomes em plano de igualdade e pela ordem alfabética – e não de um trio liderado por qualquer um deles – diz já muito, porventura, da música que esta noite irá ouvir-se num dos derradeiros concertos da temporada de jazz deste ano, de produção exclusiva Culturgest. Entretanto, neste caso particular, mais do que jazz em concreto é de música improvisada que deve em primeiro lugar falar-se, o que não contrariando a habitual asserção de que o jazz é, também ele, música que parte do improviso, coloca apesar de tudo em plano mais destacado a expressão improvisada, como sendo aquela que melhor qualificará a música que ouviremos.
É certo que há vários matizes, várias nuances, no carácter improvisado desta ou daquela obra: poderemos estar perante música totalmente criada no momento de tocar e que, como tal, se vai formando como um todo, a partir de um aleatório organizado, pelo contributo simultâneo ou sucessivo dos vários músicos em presença; é também possível que parte substancial da música tocada no momento, embora não vertida em partitura, esteja pré-estabelecida ou pré-determinada na mente dos vários componentes do trio, bastando a sinalética quase imperceptível, até mesmo só a respiração, para que se desencadeiem os necessários entendimentos no sentido de que os vários discursos individuais, aparentemente dispersos, formem um corpo internamente coerente, embora moldado à medida que os músicos vão sendo ao mesmo tempo emissores e receptores; também haverá, muito provavelmente, composições previamente escritas, na sua quase totalidade ou em grandes passagens da sua exposição, ficando depois à iniciativa de cada um a justa medida em que a liberdade individual se exercerá mesmo dentro das baias relativas que a composição prévia determina.
Do que todos podemos estar certos, à partida, é que cada um dos instrumentistas que neste concerto irão desafiar-se mutuamente, em termos criativos, se encontram entre os mais reputados no campo da chamada música improvisada ou nova música, com Courtois e Courvoisier a tenderem mais para as margens do jazz e Eskelin a puxar dos seus galões para que, também de jazz, hoje se fale em palco.

Sylvie Courvoisier: Live at Loft (2006)



Saxophone Summit
DOM 14 DE NOVEMBRO, 21.30h
Grande Auditório – Lisboa

Saxofone Joe Lovano
Saxofone David Liebman
Saxofone Ravi Coltrane
Piano Phil Markowitz
Baixo Cecil McBee
Bateria Billy Hart

Quando Michael Brecker, Dave Liebman e Joe Lovano – alegadamente os maiores saxofonistas de jazz do seu tempo – se juntaram pela primeira vez em meados da década de 1990 como Saxophone Summit, a sua missão era explorar os extremos limites do jazz, seguindo pelos caminhos que John Coltrane tinha aberto décadas antes. Quando Saxophone Summit gravou o seu álbum de estreia, Gathering of Spirits, em 2004, a crítica delirou. Infelizmente, com a morte de Michael Brecker no início de 2007, um segundo álbum com estes três titãs não se pôde realizar. Mas persistindo num pensamento e num espírito experimentais que tanto Becker como Coltrane personificavam, Saxophone Summit reúne-se de novo no álbum de 2008, Seraphic Light, que continua a celebrar e a explorar as últimas obras de Coltrane. A Liebman e Lovano juntou-se o filho de John, Ravi Coltrane, que mais do que preencheu o vazio criado pelo desaparecimento de Michael. Sobre Seraphic Light, dedicado a Brecker, diz Liebman. “A ideia original era continuar a partir do ponto em que tínhamos ficado com Gathering of Spirits”. Referia-se à ênfase dada no álbum precedente a algumas das características do último período de Coltrane: solos simultâneos, renúncia a um tempo específico, melodias e harmonias que vão do diatonicismo à dissonância. “As composições de Coltrane que escolhemos para Seraphic Light reflectem estas direcções… Por outro lado, queríamos que cada membro do grupo tivesse uma voz composicional representada. De modo que, na essência, temos dois álbuns num”. É um concerto, organizado em colaboração com o Guimarães Jazz, absolutamente imperdível.

Saxophone Summit - Coltrane's Expression (2007)



Paulo Curado, Miguel Mira, Carlos “Zíngaro”
SEX 26 DE NOVEMBRO, 21.30h
Pequeno Auditório - Lisboa

Saxofones alto e soprano Paulo Curado Violoncelo Miguel Mira Violino Carlos “Zíngaro”
Paulo Curado é o promotor deste encontro, em estreia absoluta, com o violoncelista Miguel Mira e o violinista Carlos “Zíngaro”.
Para Curado, a principal razão para se ter dedicado ao jazz e improvisação livre foi a sua participação, nos anos de 1980, num workshop na Fundação Calouste Gulbenkian com Steve Lacy, Evan Parker, Carlos “Zíngaro”, Richard Teitelbaum e Han Bennink.
Para si, “os músicos de jazz desenvolvem uma linguagem muito própria e individualizada que se exprime através dos instrumentos que tocam, que ganham timbres próprios e pessoais – o som do Coltrane, o som do Miles, ou o som do Monk ou o do Dolphy, por exemplo, para não ser muito extensivo”.
Para a música que toca que hoje se chama “música improvisada” e não “jazz”, diz “parece-me que a enorme revolução do free jazz foi a possibilidade desse papel de invenção passar de um solista para todos os músicos, ao mesmo tempo e sem diferenças de importância relativa, na criação dum objecto musical em tempo real”.
É precisamente aqui que reside a essência deste trio, a possibilidade de qualquer um dos músicos contribuir para o rumo da música que todos compõem em tempo real, todos têm controle na definição da temática do trio. Segundo Curado, “o interesse é o de improvisar em contextos musicais muito mais alargados do que o jazz e que incluem toda a cultura erudita da Europa”.
Em relação à constituição deste e de outro qualquer grupo confessa Curado, “se o pressuposto é o da imprevisibilidade em relação ao objecto sonoro, é importante a escolha das pessoas e da sua capacidade de relacionamento. Daí vai depender, em limite a qualidade do som do grupo e a sua capacidade de comunicar”.
Na música deste trio será de esperar um especial entendimento entre as cordas como será interessante seguir a sua interacção com o sopro. Desta dualidade se espera venha a identidade do trio.


Zul Zelub + Eddie Prévost
SEX 10 DE DEZEMBRO, 21.30h
Pequeno Auditório – Lisboa

Piano Jorge Lima Barreto
Computer music, kima x Jonas Runa
Bateria, percussão Eddie Prévost

Zul Zelub é o novo projecto do pianista, musicólogo, performer Jorge Lima Barreto. Nascido das cinzas de Telectu, defunto duo com Vítor Rua que andou na vanguarda da música em Portugal e no estrangeiro nas últimas três décadas, Zul Zelub pratica uma música aberta, com inflexões de jazz vanguardista, música improvisada com embrulho electrónico.
O parceiro de Lima Barreto neste novo grupo, Jonas Runa, doutorado em música electrónica e com uma sólida formação musical, é um nome a reter, o futuro o dirá. Computer music pressupõe uma utilização científica do computador e não o simples descarregar de texturas musicais mais ou menos orgânicas.
Eddie Prévost foi um dos parceiros preferenciais dos Telectu e a sua adaptabilidade às exigências de Lima Barreto justificam que o tenha convidado para este novo projecto.
Prévost é um baterista de jazz que trilhou novos caminhos na improvisação total, evidente no seminal grupo britânico AMM, de que foi fundador em 1965.
Zul Zelub poderá ser visto como um imaginário poético no acto de compor/executar, na invenção, no imprevisto, na inspiração, na emocionalidade. É uma atitude conceptual radical, uma ciberviagem.

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